terça-feira, 17 de março de 2009

O sexo dos outros












Estavas orgulhosamente bem arranjada à minha espera, a saia travada, as meias de vidro impecavelmente esticadas acompanhando cada milímetro das tuas pernas, a blusa de seda afirmava o teu corpo como era já habitual. Como sempre, ao virar da última esquina já o teu cheiro dançava na minha cabeça e me toldava o modo como tinha imaginado a noite. Seria difícil manter a postura sem que duma ou de outra forma uma mão não te acariciasse no momento menos indicado da noite, mas isso já era habitual em nós. Percorremos em diversas alturas o mistério, corremos atrás da emoção e vivemos cada momento como se fosse a última possibilidade de estarmos juntos. O importante é o nós e não aquilo que os outros possam imaginar ou sequer pensar acerca dos nosso gestos ou dos nossos rostos estampados de ímpeto e vontade de correr dali para fora. Hoje isso não seria possível e por isso ocupamos a nossa mente com a música que acompanha o tilintar de copos cheios de bebidas menos espirituais acompanhados de gestos bruscos, risos forçados de quem está por ali apenas para estar. De repente o formalidade da noite altera-se e são inúmeros os rostos onde é possível aquilatar emoções diversas, pedaços de vidas complicadas que se cruzam connosco e ás quais apetece chamar à nossa razão, pedir-lhes que sorriam e vivam cada espaço de tempo como se fosse o último. Alguns olhares cruzam-se mais fixamente connosco e parecem até desafiar-nos para instantes vertiginosos, sorrisos comprometedores surgem aqui e ali em rostos belos que acompanham corpos luminosos e que percorrem a sala em vários sentidos como se de uma caçada se tratasse. O cheiro a sexo paira no ar por entre mais um golo e um cigarro mal apagado num cinzeiro no beiral de uma janela. Do lado de fora a lua vai alta, soberba de luz e de forma, e ilumina a alma e as vontades de quem se deixa levar pelo devaneio e pela vontade de quebrar regras, numa contenda de corpos cansados de vidas monótonas e se deixassem levar em movimentos cordiais. Roupas trocadas abundam pelos sofás, enroladas em olhares que argumentam alguma culpa, manchadas de suor e bebida entornada, algumas sedas e cetins salpicados de rijeza. Já ninguém sabe bem quem é o seu parceiro do lado, trocam-se murmúrios e olhares comprometidos, gemem-se palavrões e expressões menos francas, o envolvimento é total. Impávidos e serenos, apenas de mãos dadas e encostados a um beiral, continuamos iluminados por um simples candeeiro antigo a olhar um para o outro, não precisamos sequer de trocar uma palavra seja para expressar a noite ou para censurar atitudes. A tua roupa continuava impecavelmente trajada, o teu odor estava agora mais perto de mim e de ti. Caminhámos serenamente lado a lado, ladeados por árvores enormes e grandes ramadas que escondiam a luz prateada duma lua de Agosto, mãos dadas e rindo com pequenos gestos e sabores nossos, detalhes duma parte importante da nossa vida comum. Chegados a casa
observamos em silêncio pequenos objectos que trazem à memória turbilhões de factos e emoções, pequenas grandes coisas que te abraçam e te sorriem. Agora as roupas no chão são outras, as fragrâncias.... as mesmas que sempre nos enlouqueceram.

1 comentário:

Manuela Curado disse...

Continuo a ler-te, percebendo...uma a uma... todas as tuas emoções.
Vibrante a vossa paixão